Mais de seis meses depois das fortes chuvas que atingiram o Grande Recife e provocaram 132 mortes no final de maio, o Poder Público ainda não sinalizou quais providências vão ser adotadas para evitar novas tragédias. O alerta vem de um dossiê popular construído por um coletivo de organizações sociais e que foi apresentado nesta terça em audiência pública da Comissão de Meio Ambiente da Assembleia Legislativa. Raquel Ludermir, da organização Habitat para a Humanidade Brasil, destaca que os fenômenos climáticos atingem as cidades como um todo, mas a população afetada a cada inverno tem cor e classe social.
“As tragédias socioambientais, elas acontecem com endereço já predeterminado porque as condições de raça, gênero e classe, nessa sociedade que a gente vive, determinam onde e como as pessoas moram. Não é coincidência, é racismo socioambiental, o fato dessas tragédias afetarem principalmente essa população preta, pobre e periférica.”
Pretos e pobres são maioria nos 82 territórios mapeados pelo dossiê. Mais de 60% das áreas correspondem ao que o IBGE chama de “aglomerados subnormais”, carentes de infraestrutura e formados a partir do assentamento de famílias sem outras opções de moradia. Os depoimentos colhidos na confecção do documento mostraram adoecimento físico e mental, necessidade de retornar às moradias condenadas pela Defesa Civil por falta de alternativa, insuficiência e dificuldade de acesso ao recurso do auxílio emergencial de mil e quinhentos reais. O levantamento aponta locais onde os entulhos sequer foram retirados, meses depois dos deslizamentos.
Uma política habitacional que enfrente o déficit de 113 mil moradias somente na Região Metropolitana do Recife, o mapeamento e prevenção nas áreas de risco e a criação de grupos de trabalho permanentes de contingenciamento estão entre as recomendações do dossiê. Na avaliação do deputado João Paulo, do PT, vice-presidente do Colegiado de Meio Ambiente, mobilizar a população atingida é essencial . “Nós precisamos de uma ação integrada de Governo Federal, do Governo do Estado e das prefeituras envolvidas junto com a sociedade civil. Porque nós temos como evitar e salvar vidas. É inadmissível que nós tenhamos em Pernambuco 132 mortes, sendo 50 mortes no Recife e 64 em Jaboatão dos Guararapes, sem contar em outras cidades”.
O parlamentar se comprometeu a converter os dados do dossiê em pedidos de informação dirigidos a prefeituras e Governo do Estado e organizar visitas a comunidades. Também anunciou que pedirá audiência pública já no início dos trabalhos da próxima Legislatura, em fevereiro, para tratar do inverno de 2023 nas áreas de risco.
